Carta aberta:

Excelentíssima senhora J. K. Rowling.

Antes de começar essa carta, preciso informá-la: não li Harry Potter. Não li nem o livro um, nem o dois, nem o terceiro e nem nenhum dos outros. Claro que tem exemplares na minha casa, e confesso que nem é por implicância, é mais desinteresse mesmo. Tipo, o livro ta lá, uma hora dessas eu até podia escolhê-lo no meio dos outros. Cheguei a pensar em comprar os exemplares em inglês, pra treinar, não perder vocabulário, essas coisas. Mas acabei escolhendo os do Nick Hornby, muito legais, a senhora entende, né?

Bem, voltando ao Harry, eu levei a minha prima pra assistir o primeiro filme, e achei até bem engraçadinho. Tentei alugar o segundo em DVD, mas acabei dormindo naquela parte do carro que voa, chatérrima. Não me interessei pelos outros. Sei pela imprensa quando são lançados, esbarro em garotas de treze anos vestindo capas pelos corredores da Fnac. Tipo, eu até que não me incomodo com o fato de Harry Potter existir. Fico feliz que as pessoas fiquem felizes ao ler suas aventuras junto com a Hermione e o menino ruivinho que eu não lembro o nome, mas que parece bem legal.
Acontece que acabo de ficar sabendo de uma coisa e isso muito me preocupa. Como assim Harry vai morrer no próximo livro? Tipo, eu acreditava na senhora enquanto pessoa que só ganhava dinheiro como conseqüência pela boa ação de rechear o imaginário infantil (e, bem, alguns nem tão infantis assim) com histórias maravilhosas sobre um mundo de mágicas, feitiços e amizade verdadeira sobrepondo obstáculos. Pensava, essa senhora é legal, ela escreve bem, pensa com carinho em detalhes e aventuras e diverte criancinhas. Mas qual não foi a minha surpresa ao ver que o livro que está pra ser lançado, e que será o último da série, o oitavo, o nono, nem sei, vai matar o bruxinho com cicatriz na testa.

Sinto-me na obrigação de orientá-la, não como fã, mas como alguém que ama contos de fadas e histórias ditas infantis acima de muita coisa. Eu cresci com um livro de capa dura com todos, repito, TODOS, caixa alta, os Contos de Grimm embaixo do braço. Lia uma história por dia, duas. Explicava que a Madrasta tentou matar a Branca de Neve não uma, mas três vezes, e que a maçã foi apenas a tentativa que deu certo. Desfiava em detalhes as passagens onde as irmãs más da Cinderella decepam dedos do pé e partes do calcanhar para colocar seus pés no sapatinho de cristal. Mas NUNCA, em momento algum, os irmãos Grimm mataram uma princesa. Elas sempre viviam felizes para sempre, aprendiam com seus erros e encontravam os príncipes. O próprio Rumpelstiltskin só morreu porque se rasgou ao meio, porque ficou puto da princesa acertar o nome dele. Um suicídio, por assim dizer. E mesmo nesse momento, hum, dramático, os irmãos queridos Grimm arrumaram um jeito de fazer a morte ficar engraçadinha, já que a princesa ia ficar feliz para sempre.


Mas eu queria entender de onde foi que a senhora tirou a idéia insana de que matar o pobre Harry, já tão sofrido, órfão, com tios malvados e que finalmente está “se encontrando” na vida, pode ser legal. E as criancinhas, como ficam?

Eu sei que você, J.K., vai vir com aquela clássica desculpa de que é importante ensinar sobre morte and stuff aos pequenos. Que é superimportante aprender a lidar com perdas. Mas isso, dona Rowling, serve pra quando morre o vovô, a vovó, que ficaram velhinhos e foram morar lá no céu junto com o senhor Disus. Tudo bem. E, caso a senhora ainda não tenha notado, a parte da explicação cabe aos livros de auto-ajuda para pais. Nenhuma história infantil explica às crianças como lidar com o amiguinho que morreu porque fez uma travessura, ou ficou doente. Crianças não devem ser preparadas para a morte de outras crianças. Isso vai contra o natural, sei lá, aposto que um psicólogo vai saber te explicar isso melhor que eu. Deixa os pobrezinhos acreditando que o Harry existe, e que vai crescer, e que é feliz, ainda que não tenha mais livros continuando essa história. Como assim matar o Harry, dona escritora? Tudo bem que a história é sua, mas isso não é coisa que se faça, não senhora.

Os irmãos Grimm deixaram as princesas serem felizes para sempre, não deixaram? O Lewis Carrol botou a Alice nas maiores enrascadas, mas me diz se a rainha de copas cortou a cabeça dela no final, hein? Me diz? O Mowgli voltou para a cidade. Tistu, o menino do dedo verde também transformou Mirapólvora em Miraflores, e viveu feliz. A Rapunzel foi feliz, o Nemo foi feliz, Lilo e Stitch, felizes. Pegou?

Então, seja coerente com aquela senhora que se solidarizou com os pais de Madeleine ainda outro dia, e deixe o pobre Harry feliz, e vivo. Não tem sentido ser legal com os filhos desaparecidos dos outros e usar o seu próprio de mártir.

Sinceramente,
Madame Ç.

Madame T diz:
pontual a minha ansia pelo emagrecimento nao?
Madame T diz:
vontade enorme de mudar.
Madame Ç diz:
é apenas mais uma característica da nova versão.
Madame T diz:
de tirar a casca da minhoca pra virar borboleta.
Madame Ç diz:
não é minhoca. é lagarta. e não é casca, é crisálida.
Madame T diz:
isso, mestra.
Madame T diz:
eu era lagarta senior. to arrancando a crisálida. agora sou uma borboleta junior.

Prestem muita atenção na história que eu vou contar. É história triste, já adianto. Não que ela faça alguma diferença na vida de qualquer um que se disponha a ler este post, mas ela afeta a mim, sempre, pobrezinha, há, deixa ver, hum, 24 anos, com uma piora significativa há 21 anos.

Toda a paz que eu tive na minha vida acabou ainda antes dos 4 anos de idade, quando nasceu minha irmã. Eu não tinha pedido irmãos. Eu gostava de ser filha única. E ela veio, e eu fui convencida de que dividir os meus brinquedos com a minha irmãzinha era legal. Não era.

Tentei barganhar, pedi que fosse um menino, ao menos. Tarde demais, o bebê era menina. Ganhei uma boneca, daquelas de corpo de pano e cabeça, braços e pernas de plástico, sem cabelo, vestida de azul. Uma boneca menino, prêmio de consolação. Dei a ela o nome de Eduardo, e a vida seguiu. O tempo passou e eu ainda queria um irmão. E eu pedi por aquilo que, hoje, viria a se tornar a razão do meu desassossego.

Ele veio morar comigo há coisa de seis meses. Dividam o espaço, meus pais disseram. Ele usa o meu computador, rouba as minhas meias e enche de músicas o meu HD. Tudo bem, imaginava, não posso ser babaca e tomar dele o acesso ao único computador da casa, que por acaso é meu. E ele espalhou fotos, baixou programas. Diz que a música que eu ouço é um lixo, pede carona e usa meu shampoo de pitanga. Desaparece com a caixinha de fio dental, come o meu queijo cottage e faz a barba na pia. Tudo bem. Irmão, se não atrapalhar a vida da gente, é porque veio com defeito de fabricação.

Eu comprei uma escova de dentes novinha, lilás, pra substituir a minha. E ele me acorda assim: “Tata, joguei a minha escova velha fora e peguei aquela nova que estava na sua gaveta.” A minha escova, cuidadosamente escolhida, pronta para a substituição de praxe de cada 3 meses, o que seria exatamente aquela manhã. A manhã em que ele resolveu trocar a dele. Ele me chama de Tata, o larápio insensível.

Mas o pior é uma fixação absurda e inexplicável que o indivíduo tem com pilhas. Desde pequeno, ele rouba pilhas das gavetas, dos aparelhinhos espalhados pela casa, dos controles remotos. Um dia, meses atrás, depois de uma semana cansativa, num sábado de tarde, eu me sento no sofá e pego um dos muitos controles da casa, o que comanda a net. Achei o controle remoto leve, estranhei, e qual não foi a minha surpresa ao descobrir que ele estava com um imenso vazio onde deveriam estar as pilhas A3, que eu mesma reponho sempre. Nada. Ele estava viajando. Comprei mais pilhas, passei um senhor esporro, reclamei com pai, mãe, toda e qualquer autoridade que me veio à mente no desespero, ameacei tirar a mesada, o acesso ao computador, etc. E ele jurou que não faria de novo, mas é que por coincidência as pilhas do mp3 player dele eram daquele tamanho e o aparelhinho consumia mais energia que qualquer outra coisa. Eu fico me perguntando que espécie de lógica é essa que leva um homem feito com 21 anos nas costas achar que as pilhas de um controle remoto não estão em uso. Elas não estavam na gaveta, pelamordedeus, estavam no controle. O controle com pilhas serve para passar comandos à televisão. Que serve, por sua vez, para ser assistida, e tem especial utilidade em casa de Madame Ç.

Achei que ele tinha aprendido a lição, relaxei. Comprei pilhas novas, repus. Dois meses depois foi o controle do DVD Player que ficou leve. Ele, o irmão mau-elemento, novamente em viagem. Repetiu-se o ritual com o telefonema, os gritos, as ameaças, as reclamações com a mãe, depois com o pai, que garantiram um outro esporro daqueles. Comprei pilhas, repus. Ele nega até a morte a autoria desse delito específico. Mas moramos eu e ele, e eu sei que eu não fui. Whatever. Larápio.

E então, neste último fim de semana, novamente no sábado, pego eu o controle remoto da net, aquele vítima do primeiro roubo. Aperto os botões e nada acontece. Ué?! Leve ele não está. Viro o controle, abro a tampinha do compartimento de pilhas. Há pilhas. Pilhas velhas, descombinadas, inseridas – PASMEM – ao contrário. Tipo o positivo com o negativo. Tem um desenhinho em alto relevo explicando a posição, e ainda assim ele recolocou as pilhas ao contrário. Óbvio que elas não funcionavam. As pilhas que EU tinha comprado e reposto eram iguais, tipo da mesma marca e, importante, estavam na posição correta. Essas pilhas foram para o mp3 player do maluco, e ele me garantiu que elas também já acabaram. Liguei para o meu pai, uma última esperança pra que um outro esporro viesse e eu pudesse me sentir, de alguma forma, vingada. Meu pai, tadinho, aproveitou que o assunto veio à tona e disse que era pra eu avisar ao ladrãozinho que ele devolvesse as pilhas recarregáveis roubadas lá de casa no último fim de semana. E eu me sinto absolutamente desamparada, helpless, nas mãos de um maníaco ladrão de pilhas.

Coisas que só acontecem com Madame T.

Sábado 11 horas da manhã: acordo. Sábado 12:30h: durmo. Sábado 14h: acordo e penso na vida.
Trabalhei tanto pra que? E agora, o que eu faço da vida? E aonde isso vai dar? Sábado 15h: análise. Existencialismo. Sábado 16h, devidamente analisada, devidamente só, inteira e plena, entendo que é hora do alimento.

Restaurante vegetariano, carro parado em lugar inadequado. Penso que será rápido. Sentei-me em uma mesa grande, pertinho da parede. Até que chega uma pessoa e senta na minha diagonal direita. Pensei logo: hum, essa ai vai querer conversar. Monte de mesa vazia, sai de perto de mim. Não sou sua amiga, não te conheço, acabei de sair da análise e não tô nem aí pra esse seu papo raso. Pensei baixo, mas de alguma forma acredito que o ser humano entendeu.
Aí, eis que olhando de rabo de olho para o ser humano, me deparo com um broche, UM BROCHE, redondo, grande, que dizia: reduzi (espaço para alteração de números, no caso 6) kilos. Pergunte-me como. Nesse momento quase que eu fui até o ser humano despejar feijão sobre seus cabelos.
Aí, o ser humano saca um pote cheio de remédios escrito Herbalife e deixa, estratégicamente, em cima da mesa. Nesse momento eu quase chutei.
E pensei.
Se você vier falar comigo tá fudida. Se você vier me vender essa bosta, você vai ouvir. Eu não to boa hoje. Hoje eu to sem saco pra gente medíocre. Completamente sem paciência pro tipo de gente que acha bacana sair com broches sugerindo que pessoas perguntem alguma coisa.
Se você vier falar comigo sobre essa bosta desse produto eu vou dizer que eu tenho uma nutricionista com doutorado e o que ela tem é um discurso chatíssimo que eu não to a fim de ouvir. E eu vou dizer que não adianta nada você emagrecer 6 kilos se você anda com broches escrotos por aí.
Aí eu levantei pra pegar mais coisas. E ela aproveitou o momento pra converter o outro ser humano, na ponta da mesa, coitado. O cara era magro. E ela estava fazendo o discurso contrário ao seu próprio broche. De que o cunhado dela pesava 54 kilos e agora pesa 74 kilos. E perguntou o que o cara fazia e onde o cara morava. E eu perplexa.
O cara estuda música. E o cara dá uma força pro pai nuns eventos que eles fazem na fazenda, que era haras, que era do avô, e que agora é um lugar que eles alugam para que as empresas façam eventos motivacionais para seus funcionários. Aham. Que gente mais média. E a herbalifer calculando se ele teria ou não dinheiro pra ela estudando música.
Ela é distribuidora da herbalife, empresa americana com 27 anos de mercado, com seus produtos desenvolvidos por pessoas da nasa. Juro. Não to inventando.
Aí depois entraram num assunto chatíssimo dos motivos pelos quais ambos não comem carne. Ambos comem peixe.
Bom, se eu tivesse no McDonald´s, teria ganhado os brinquedos do novo McLancheFeliz e não teria ouvido nada, na-da, disso. E nem teria visto um ser humano com aquele broche surreal.
Esse povo que vende essas coisas é diretamente proporcional ao povo que prega Jesus.
Aí, sábado, 17h: dormi outra vez. Sábado às 20h: acordei. E daqui a pouco eu vou dormir, porque a vida é isso: acordar e dormir.

Quarta feira. Há tempos atrás esse seria um dia normal, comum, apenas ali, recheando a semana. Um dia sem graça, simplório, tacanho, medíocre e sem personalidade. Acontece. Mas aí chegou o estagiário insolente por aqui, provando por A mais B sua teoria de que as quartas feiras são dias amaldiçoados, do demo, que apenas existem para ferrar com a vida dos desavisados. E ele começou a me mostrar que as coisas bizarras, chatas pra caramba, sempre dão um jeito de acontecer, não na terça, não na quinta, mas na quarta. Sempre na quarta.

Eu fiquei doente numa quarta. Meu MBA dos infernos é sempre quarta e hoje, especialmente, é dia de uma prova absolutamente imbecil. Alguns feriados acontecem na quarta, só para que não seja possível emendar. Eu acordo, me arrumo, ponho minha sapatilha de bolinhas e, ao escovar os dentes antes de sair, sinto o pé meio gelado. Olho para baixo, estranho, meu pés estão molhados. O chão está molhado. A água pingava de dentro do armarinho da pia, ok, abro a porta e uma pequena cachoeira se forma, límpida. A fonte? O cano da pia, que o zelador do prédio - claramente mais bem informado que eu – não tardou a me apresentar. “É o rabicho, dona madame Ç. Só comprar outro que nóis troca pra sinhora.” Rabicho. Ok. Rabicho pra mim é diminutivo de rabo, um fiapinho no fim da coluna dorsal dos mamíferos. Mas, aparentemente, também se trata do cano maldito que pinga sem parar, agora, nesse exato momento, lá na pia do meu banheiro. Quarta feira, senhores.

Mais considerações sobre o seqüestro de Peteca, a carra.

Há tempos atrás, vocês sabem, madame Ç andava de ônibus. Madame T dirigia uma mercedez 1979, que fazia litros por kilômetro, e não o contrário. Aparecia buzinando e as duas Madames, na banheira ambulante, zanzavam por aí. Daí as Madames concluíram que era hora de comprar carro. E escolheram modelos idênticos, quase ao mesmo tempo. Um prateado, ops, prateada, carra, Peteca. E um azul, menino, bebê, Tistu. Petaca e Tistu andavam por aí, até que Peteca foi transferida para a selva de pedra. E lá permaneceu, ao léu, à mercê da boa vontade de estranhos.

Madame T sempre encheu a boca pra dizer que Madame Ç era paranóica. Só pára em estacionamento fechado, vejam só. Chave na mão de estranhos, tá maluco, mermão? Te conheço? Não. Minha chave fica comigo, na bolsa. De vez em quando eu procuro por ela, só pra saber se ainda está ali. E Madame T deixa a chave com o flanelinha da esquina, para que ele mova a carra quando necessário. Madame T confia. Madame Ç desconfia. Sempre. Do irmão, da irmã, de qualquer um que se atreva a achar que pode bulir com meu filho querido.

Aí Madame T aparece na janelinha do MSN e fala que a carra foi seqüestrada. Abduzida, subtraída, abusada. Pelo Jorge, o maluco so-called gente boa pra quem ela entrega a chave, na confiança, todo dia. Como assim ela entrega a certidão de nascimento, o documento de identidade, o único capaz de provar que a carra é filha dela? Madame T acredita nas pessoas. E isso é coisa de principiante.

Se eu soubesse que madame T vinha deixando Peteca assim, na mão do palhaço, do maluco maldito filho de uma puta do jorge, eu tinha falado pra ela que isso, sim, é coisa de doido. Imagine só. Foi numa dessas que a pobre da Madeleine, garotinha que desapareceu em Portugal, se perdeu. Cadê Madeleine, eu pergunto. Eu duvideodó que JK Rowling e David Beckham iriam topar participar da campanha em busca da Peteca, a carra da madame T.

No meio da espera por jorge, o larápio de carras indefesas, o pai da Madame T se divertia. Falava para a filha, executiva espertinha, que sabe tudo, que tem que conversar com o Jorge antes de resolver trocar de carro, pra ver se ele tem alguma preferência de cor, modelo, essas paradas. E eu daria de um tudo para estar por ali, fazendo piadas de mau gosto enquanto ela esperava pela volta do seqüestrador. Tem que escutar seu pai, madame. E a mim também. A gente sabe o que diz.

E eu acho isso muito genial mesmo. Porque prova my point de que tem mais é que desconfiar de todo mundo mesmo. Imaginem só. Jorge maldito. Peteca sem seguro de vida, dando pinta por aí, sabe-se lá por onde, oh céus, não gosto nem de pensar. Subtraída de seu convívio. Então, minha cara, antes que eu cogite mandar o juizado de carros menores ficar esperto no seu caso, recomendo mais atenção, menos confiança, um tiquinho de cuidado. Fala pra Disus ficar esperto na Peteca, que é ela que anda desamparada. Pobrezinha.

Peteca é minha carra. Suponho que vocês saibam. Nos tempos da outra firma, Peteca foi salva por Disus do estacionamento que ruiu, na época do buraco do metrô.
Na firma nova, Disus cochilou com a Peteca. Tá prestando mais atenção em mim, é verdade.
O estacionamento da vez: o Paulo que virou Jorge.

Sempre que eu chego, entrego a chave pro Jorge, que diz: bom dia Rio de Janeiro, vai querer o carro pra quiora? Eu digo a hora e sumo enquanto ele some com o carro. Sempre foi assim.

Dia desses fui buscar minha filha para irmos à festa. Tínhamos uma festa da firma para comparecer. Peteca, ciente de que não deveríamos ir, não ligou. Não se manifestou, não arredou pé. Garota esperta que só ela.

Nada pude fazer. Fui de carona. Falei para o Jorge: o carro não liga. Ele me perguntou se eu não queria que ele colocasse o carro na garagem. Disse que queria, mas que se o carro não ligava talvez ele conseguisse levar o carro nas costas para a tal garagem. E deixei a chave com o Jorge.

No dia seguinte fui ver em que situação minha filhota se encontrava. Segundo o Jorge, ela estava na garagem. Disse para eu não levar o carro, pois se ela morresse na rua, eu teria que chamar o reboque. Concordei. Meu pai estava a caminho da cidade grande e ele acabaria com a pirraça. Coisa de vô que sabe o que faz.

Jorge pediu que eu deixasse a carteira de identidade da Peteca para que ele deixasse com o seu Manuel, nome para ser humano inexistente que segundo reza a lenda fica na garagem, para que quando eu fosse retirar o carro, ele checasse o nome da dona do carro e não criasse transtorno.
Me perguntou se eu tinha feito seguro de vida pra Peteca no meio de uma conversa de que era perigoso deixar o carro na rua, e que por isso, tirou a bateria do meu carro, colocou a de outro carro na Peteca, para que ela fosse dormir em paz, na garagem. Que bom Jorge! Não tenho seguro.

Isso foi na quarta. Na quinta, Jorge me liga. Jorge me liga pra dizer que o estacionamento ficaria fechado na sexta-feira e que só abriria na segunda-feira de manhã. Ah é Jorge? Poxa, que pena. Meu pai vai querer ver o carro Jorge!

Bom Jorge, eu avisei. Fomos, eu e meu pai, rumo ao estacionamento fechado. Aberto.
A porra do estacionamento estava aberto. E cadê a minha filha? Sequestrada. Kidnapped.

Alô? Jorge? Eu estou com meu pai aqui no estacionamento aberto e meu carro não está aqui Jorge. Cadê meu carro, o cara? Tá maluco? Cê tá ficando doidão?

Calma Rio de Janeiro, eu to aqui fazendo um serviço em Pinheiros, seu carro está num outro estacionamento, já desço pra buscar pra você.

Ô Jorge, eu quero A-GO-RA. O filho da puta apareceu com o meu carro, lavado, sem o chaveiro na chave, com o chaveiro no porta-luvas, que tinha um tanque cheio de gasolina master mega plus aditivada, vaziinho.

Aí, Jorge ouviu. Mas muito. E amanhã Jorge vai ouvir mais. E eu, sempre muito sorridente, que achava Jorge muito gente boa, vou deixar de ser besta. Parei. Eu custo a crer que as pessoas são assim. Mas são. Uma parte delas é.

Mas Disus, sabe como é. Faz essas coisas pra me alertar. Peteca tá bem, manda beijo pra vocês.

Todo final de semana é assim. Eu sento na poltrona branquinha, enrolada em panos, posiciono o aquecedor que resseca o ar bem na minha frente, leio o jornal. Ligo a tv e o note. E fico, fico, fico.
Dormi 13 horas de ontem pra hoje e continuo parada na poltroninha. Acho que eu sou uma espécie de aparelho. Trabalho com afinco durante a semana e nos dias livres demando carga.
E nos finais de semana que eu não posso ficar muito tempo assim, tenho a impressão de ter dado apenas meia carga, coisa que, reza a lenda, danifica o aparelho.

Seria eu um celular, uma câmera digital, um notebook, um palmtop?

Madame Ç foi abatida por uma gripe monstra. Ela vinha se gabando há meses, debochando dos combalidos, dizendo que não tinha nada de gripe "pra mais de dois anos", vejam só. Via os narizes que escorriam e falava que tem que comer direito e todas as outras coisas que ela não faz. E o irmão de Madame Ç trouxe o vírus maligno para dentro do calor do lar doce lar e ela se viu, anos depois do último embate, frente a tão horroroso e maligno vírus. Não fez nada, pra que fazer alguma coisa, dizem por aí que gripe com remédio cura em sete dias e sem remédio cura em uma semana. Confiou no sistema imunológico, em seu pequeno exército que não tardaria a rumar para, sei lá, os gânglios / QG principais, que se organizariam e resolveriam o "incômodo". Isso foi num domingo. Segunda passou, terça veio, quarta foi e quinta ela piorou. Providencialmente era dia do mba que não acaba nunca. Não vou, hehe, estou doente, boa desculpa, iaê. Foi pra casa, viu seriados, fez downloads, comeu frango agridoce e coca-cola de um suspeito China in Box. O irmão melhorou, viajou. Madame Ç piorou, mas foi trabalhar bonitinha. Chegou no ambiente gelado e avisou que estava morrendo. Ninguém acreditou. Ela queria mesmo era ser mandada pra casa pela chefa. Mas ela não se apiedou, e Madame Ç fungou, tossiu, espirrou, reclamou, chiou, tossiu mais um pouco. E foi pra casa no fim do dia. E matou aula de francês, e se entupiu - finalmente - com um naldecon noite. Arrastou-se pela casa com o edredon nas costas durante todo o sábado, tomou um daqueles banhos bem quentes de horas, achando que ajudava. Domingo parecia melhor, mas a outra segunda veio, e a garota estava - ainda - sem sinais de melhora. A cabeça latejante se juntou aos sintomas iniciais, a pele ficou mais quente que o normal. Toda a equipe havia sido contaminada na sexta feira última, aquela da piora. Todos tossiam e espirravam, e assoavam os narizes cheios de muco, e tossiam. Madame Ç ficou meio puta, porque os holofotes se dividiram e todos, agora, estavam sofrendo. Mas não pôde evitar um sorrisinho, daqueles de canto de boca, e dizer para a chefa que se ela tivesse tido a *decência* de me mandar pra casa naquela sexta feira fatídica, teria na segunda feira pessoas saudáveis na equipe. A culpa não era minha, vejam bem, era dela. Da chefa maligna, capitalista, que grita "foco" como chibatadas, mandando que as pessoas produzam. Que também estava gripada, hehe. E a garota tomou mais remédios, e dividiu suas vitaminas C efervescentes com seus co-workers. Na terça feira, o estagiário insolente sucumbiu. Todos os outros se mantiveram firmes em suas funções. E Madame chiava, e tossia, e espirrava, e maldizia o ar condicionado que até, em sinal de piedade, abrandou a geleira habitual. A quarta feira veio, e a garota resiste, combalida, meio morta meio viva, tentando obedecer a outra garota, que falou que é muita vergonha demais mesmo que ela deixe o blog assim, às moscas. Essa foi a gripe mais longa de todos os tempos. Está sendo.

Virá o feriado de corpus christi e eu só penso no meu corpus, dolorido, ferrado, sofrido.

Peço que elevem suas mentes e seus corações ao tal de Disus e façam uma prece por minha saúde. A física. A mental, não tem reza que conserte. Perguntem à outra Madame. Ela sabe.

(Se sobrar um restinho de tempo na prece, peçam por Paris, enjaulada, sofrida, sem Tinkerbell para praticar amizade e sem paparazzi. Paris precisa de nós.)

Caceta Garota!!! Toma vergonha e escreve nesse blog. Daqui a pouco a Uanessa anuncia sua separação e você aí, marcando bobeira.

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