O menino andava cabisbaixo. Achei que era por causa da quarta-feira, dia que ele faz questão de declarar: odeia. Fala tão mal das quartas que começou a me deixar meio paranóica, como se fosse realmente um dia amaldiçoado. Não é início de semana, não é final. Não há o que esperar, não está próximo de nada, geralmente é um dia quente, e seco. E perdido, ali, imprensado no meio da semana. É dia mais longo ainda pra mim, já que me obriga a, depois do trabalho, me colocar em uma sala cheia de frequentadores de academia, professores monocórdicos e matérias nem sempre interessantes, em uma pós-graduação que parece não ter fim.

Por causa do menino, primeiro, ao acordar, antes mesmo de levantar, pensava comigo: "Hoje é quarta-feira". Dia do menino ficar casmurro, trancar o sorriso e deixar o ambiente mais silencioso, mais triste. O menino é muito feliz, tem um sorriso que enche o rosto magro de cabelos arrepiados. Mas, desde uma quarta-feira ele andava quieto, duas ruguinhas na testa, preocupado. Olhei para a mesa do lado, pedi que ele cessasse a música dos fones, e perguntei: "É porque hoje é quarta-feira?". Ele disse que não, não entrou em detalhes, "coisa minha, problemas". Não quis dizer, respeitei o silêncio. Difícil isso de respeitar o silêncio preocupado dos que nos são queridos. Me apertou um pouco o coração, e eu pedi que ele me avisasse quando tudo fosse ficar bem.

E a quarta passou, a quinta, o final de semana. Ele ficou ausente nos almoços, silencioso durante o trabalho. E outra quarta veio, e eu perguntei se as coisas estavam melhores, e ele disse que não. E eu fiquei, mais uma vez, de coração apertado. Nada podia fazer. O menino sorridente e feliz ficou sério, o menino falastrão ficou mudo, os cabelos arrepiados se assentaram. E outra quarta veio, e mais outra.

E hoje, no carro, voltando do almoço, ele teve uma crise de riso, daquelas antigas, falando besteira. E ele riu, e na hora eu nem me toquei. Disse que ia pra casa, dormir, enquanto eu e os outros voltaríamos para o trabalho, pra cumprir com o resto das pendências. E, no fim da tarde, meu telefone tocou, e era o menino.

Não dizia coisa com coisa, falava alto, meio gritando, que estava tudo bem. Balbuciou algo sobre como funcionam as coisas no seu mundo, usou metáforas que eu não entendi, sobre coisas que o preocupavam. Seja lá o que o tivesse calado nas últimas semanas, estava acabado, e ele queria que eu soubesse, e estava ligando pra me contar, pra me tranquilizar. E me tranquilizou. E deixou a minha sexta-feira, que estava tensa, aborrecida e com cara de quarta, mais leve. E me fez acreditar que talvez, quem sabe, uma hora dessas, todos os motivos que me calam e me preocupem cessem também, e que possa ser eu, no telefone, a pessoa aos berros e feliz.

Desculpa blog, não to conseguindo dar a atenção que você merece. Outros assuntos me consomem. Como por exemplo o fato de que eu tenho que pedir demissão nós próximos sessenta minutos. Sessenta não. Vou enfrentar. Vou agora. Ai.
(Fui)
Pronto. Pedi. Tenso isso de pedir demissão. E justo daqui. Vou ter que me desfazer do meu crachá cheio de superpoderes. Vou ter que colocar minha carra Peteca em outro estacionamento. Vou me juntar ao grupo das poucas pessoas que saem daqui, dessa enorme caixa de Lego, cheia de possibilidades. E tudo isso porque eu quero jogar videogame. Lego é muito legal, mas videogame brilha. Mas Lego brilha. Mas videogame brilha. Mas Lego brilha. Mas videogame brilha. Mas as crianças de hoje em dia só querem saber de videogame.
E então eu pedi demissão. Porque a hora de fazer merda é agora. Porque eu já troquei o Rio por São Paulo. E eu não sabia disso na hora em que eu resolvi dizer pro meu chefe que eu ficaria em SP, em meados de fevereiro do ano passado, mas talvez a decisão mais difícil tenha sido aquela. E só Disus sabe o que eu tenho enfrentado desde então. A garota até imagina, acompanhou de perto, de longe, mas não sabe. Só eu e Disus.
Me lembrei dia desses de uma das minhas aulas de ballet. Era um professor convidado. Eu adorava quando eram pessoas novas dando aula, porque eles eram sempre novas chances deu ser descoberta como a melhor bailarina do planeta.
E esse cara foi pra diagonal da sala, fez uma fila com as bailarinas, e mandou que a gente corresse, uma de cada vez, até ele, de olhos fechados. E eu nunca fui descoberta a melhor bailarina do planeta, mas eu fui a única que conseguiu correr de olhos fechados até que ele me segurasse.
O professor foi pego de surpresa, ele estava acostumado com a desistência nesse exercício, mas eu sabia antes de começar que eu conseguiria.
E agora é a mesma sensação. De que pode dar merda, de que eu posso dar com a cara na parede, levar uns pontos e quebrar o queixo. Mas eu vou correr. Porque sou exibida. Adoro ser a única.
E eu pedi demissão.

Dentre os meus milhares de defeitos, logo ali, atrás do "eu não paro de reclamar", está o que, talvez, em toda a minha vida, tenha me trazido mais problemas. Eu falo demais. Não é o tipo falar demais que não deixa ninguém falar, porque esse é o meu defeito número 3, é um outro tipo de falar demais. E também não é falar demais de fofoca, porque esse defeito - que todos temos, atirem a primeira pedra - fica neutralizado pela minha qualidade que é ter noção. Eu já me ferrei muito com fofoca, fiquei vacinada. O meu falar demais que me traz problema é me meter em conversa alheia. Tipo eu falo mais do que deveria pra gente que não tem nada a ver, e isso me colocou em uma enrascada - mais uma - na semana passada.

Entrei no elevador com duas pessoas do mba, e elas estavam comentando sobre academias no bairro, aquele papo que realmente não me interessa, vazio, vazio. Mas estávamos dentro de um elevador, e o meu defeito numero 1, que é inabilidade social, e que me constrangia, e que fazia daqueles poucos segundos um verdadeiro martírio, me fez tentar preencher o suposto silêncio com alguma brincadeirinha. E a menina dizia que estava muito preocupada porque disseram que academia no bairro tinha muita puta, e etc. E *erro numero 1* eu me meti. Concordei, falei que era assim mesmo, porque em uma fase da minha vida que eu nem lembro mais, eu ia pra uma academia supostamente legal e malhava com putas. Porque eu malhava meio dia, e meio dia - segundo minha análise - era horário que puta acordava e ia malhar a bunda na academia. Fato é que eu malhava com garotas supostamente bonitas, todas de cabelo solto (na academia!), e de rímel (na academia!), e de argolas (na academia!). E eu achava que elas deviam ser putas mesmo. E, *erro numero 2*, eu disse pra essa garota que toda academia do bairro só tem puta, generalizando mesmo, erro grave. Ela discordou, porque malha, não porque é puta, e se ofendeu mesmo. E ficou um climão no elevador. Mas eram só dois andares, descemos todos e fomos cada um em direção ao próprio carro. Me senti meio mal, mas achei que não era nada de mais, fui pra casa e dormi o sono dos justos.

E a outra garota do mba, presente no entrevero, a loura que também malha mas não é puta foi dizer para outras pessoas, que eu tinha batido boca no elevador, uma coisa meio barraco, vejam só. Meu nome na mesma frase que a palavra barraco, coisa inédita até então. E eu sei que mereci isso, porque me meti em conversa alheia de garotas louras frequentadoras de academia, com seus tríceps e bíceps, e argolas, e conversa de elevador. E minha turma do mba tem um monte de exemplares dessa espécie, os freqüentadores de academia. E tudo leva a crer que eu ofendi a classe.


E que fique bem claro que eu não reclamo da fofoca, em si. Fofoqueiros somos todos. Eu sou, a outra garota é, você também, muito provavelmente. Mas fazer fofoca perto de amigo de quem se fala é erro de principiante. Porque você é descoberto. Até pra ser fofoqueiro é preciso perícia nessa vida.

Mais do mesmo. Eu falo demais. Sempre. E reclamo demais. E sou ríspida, apesar da fofura que se estabeleceu nas últimas semanas, que eu não entendo e que já se faz notar, e rende piadas engraçadinhas. Eu acho que concordo. Talvez sim. Talvez eu esteja ficando simpática, e fofa, como não se cansam de me acusar. Eu tiro meus anéis e coloco as luvas. Faz frio. As mãos continuam geladas, mesmo dentro da camada grossa de lã. Sinto os pelinhos do braço arrepiarem, as pontas dos dedos frias, os olhos querendo fechar. Eu queria estar em casa. Quietinha. Com as luzes apagadas, no máximo um abajur. A tv jogando imagens sem sentido, um livro no canto, as revistas japonesas emprestadas, que só agora descobri que abrem pelo lado de trás. Tantas cores. Queria folheá-las sem culpa, sem pressa. A tv ligada, passando alguma coisa sem sentido, qualquer coisa. Meu caderno azul e umas canetas coloridas, pra fazer uns rabiscos, copiar falas de filmes, fazer listas de tudo o que ainda não vi.

Não é de férias que eu estou falando. É de tempo, de distância. Vontade de ficar sozinha. Não por dois ou três dias, até quando eu quisesse. Sem culpa, sem telefonemas. Pijamas o dia todo. Seriados. Sem relógios, sem despertadores, sem celular. Sem campainha, interfone ou qualquer outro tipo de apito. Nada que me perturbe, nada que me distraia de mim mesma.

Água quente, comida quente. Almofadas. Os gritos estão abafados e eu fiquei fofa.

Quando eu entrei na firma, a garota me pediu um email-descritivo-primeiras-impressões. E eu, lógico, escrevi.

Aí vai:

Well, well, well. Cheguei.
Nono andar. Muitos rostos novos. Cartazes de mulheres peladas disputando espaço com cartazes de lançamento do álbum das princesas. Harmonia.
Duas secretárias. Até agora não entendi bem o porquê de duas secretárias.
A sala do diretor é daquelas bem grandes, e eu, em minha curta experiência profissional ouvi dizer que esse modelo de negócio em que há uma sala enorme para uma única pessoa é coisa do passado. Tendo em vista que essa área - sala do homem - ocupa metade de um andar, e que são 22 andares, e que em cada metade de andar deve haver uma sala desse tamanho, acredito desde já que há um enorme desperdício de espaço neste suntuoso edifício.
Claro que o tamanho da sala e o lance de secretárias em dose dupla, têm a ver com aquela questão clássica de signos e significados. Demodé. Recalqué.
Foi junto à dupla de secretárias que me sentei em meus dois primeiros dias. Eu precisava de computador, email, telefone e mesa. Mais que de amigos, bem mais. E Deus, que é 10, me colocou ao lado de quem eu mais precisava.
A secretária mais antiga, cobra criada, anos e anos de empresa - coisa normal por aqui - não gostou de mim. Eu tenho esse poder que contraria toda a minha adorabilidade e capacidade de amar seres humanos. O fato é que eu rapidamente me aproximei da secretária número dois, que por ser a número dois, é menos solicitada, menos importante, e tem menos amigos. Um prato cheio.
E por ela ser a número dois, só hoje, cinco dias depois, consegui um email.
Fico ao lado da redação da Playboy. O clã fica numa sala pequena, fechada por uma porta em que há um quadrado de vidro. Sempre que passo por lá, dou uma olhada para iniciar uma amizade que pode me levar pelada às bancas deste país, em contrapartida de quaisquer cem mil reais.
A questão é: eles não existem. Lá estão mesas e cadeiras dignas de diretores, vazias. Intrigante.
Não entendo exatamente o que faz cada pessoa, e enquanto eu não souber exatamente o que faz cada pessoa, não me darei por satisfeita. E isso inclui a segunda secretária.
Todos os dias, uma sorte imensa de biscoitos é posta a nossa disposição. Tivemos uma pausa para alongamento e ginástica, além de massagens para os funcionários dia desses na hora do almoço. Tudo me leva a crer que produzir material editorial para revistas é o negócio mais rentável do planeta - e por isso o empenho neste email - ou essa empresa irá a falência em poucos meses.
Preocupo-me com o meu ir e vir neste edifício, quando minha anfetamina se der por encerrada. Nosso crachá, quando aproximado a um sensor, permite que você pegue todos os chocolates, refrigerantes, sorvetes, sucos, salgadinhos, cafés, fandangos, sim, fandangos da lanchonete e saia sem pagar. Basta aproximar o crachá. Acredito que esse conceito tenha sido introduzido pelo R.H., com base numa tese de um estudioso da Estônia, que defende a liberação de tudo que foi reprimido na infância como forma de aumentar a produtividade criativa das pessoas no trabalho.
Sim, aqui trabalham pessoas, não recursos. Muda um pouco o conceito, mas não diminui a encrenca.
Em suma: aqui eu tenho a possibilidade de conseguir uma contra-capa de Playboy. Caso isso não aconteça, posso encher o maracanã de balas juquinhas, e realizar o sonho do meu amigo Diogo.

A garota reclama que tem 8 posts dela e nenhum meu. E que eu não posso ficar falando que ela não posta. Temos diferenças básicas nos nossos posts. Os meus são longos, os dela são curtos. Quase que pequenas análises sobre coisas do dia a dia. Eu, falo de trabalho, de tédio, de irritação, um pouco mais de trabalho. Reclamo que preciso de férias. Só sei reclamar, ela diz. Pode ser.

Eu estou sem nenhum assunto em especial sobre o qual eu queira muito falar. Sobre o qual valha o tempo em frente ao computador, encurtando ou alongando linhas, com um pouco de medo que alguém diga que não ficou bom, que eu escrevi só por escrever. Tenho que tomar cuidado pra não me perder na minha própria crítica. A garota reclama e diz que disseram que ela tem duas caras. Mas, duas caras, não temos todos? Eu tenho.

Há muito eu perdi aquela ingenuidade de que a gente é legal assim, só por ser legal. Somos legais porque, de alguma forma, o ato de ser legal nos traz algo. Da pessoa com quem estamos sendo legais. Altruísmo é coisa que não existe nesse mundo. Tipo a janela de msn que piscava agora há pouco, perguntando de bbb. E eu dei corda, e conversei. E a pessoa me pede um favor. Outro. Uma pessoa que eu adoro, mas que SEMPRE me interrompe no trabalho pedindo coisas. E que me cobra quando eu não cedo. Isso me cansa, sabe? Bastante.

E esse post deve estar chato, como todos os outros posts que eu não andei escrevendo essa semana estariam. E é por isso que eu poupo os nossos 17 leitores dos meus surtos, e os deixo com os bons textos divertidos da outra garota. Até que eu tenha algo relevante ou divertido para dizer. O que não tem sido o caso.

Eu sempre quis escrever sobre aviões, mas eu sempre achei que nada que eu escrevesse sobre aviões seria suficiente pra eu descrever a sensação que eu sinto. Adoro. Amo.
Eles precisam ter exatamente aquela forma pra sair por aí voando. A forma perfeita, exata. E a matemática exige: ele tem que ser assim.
Peço pra que me coloquem na janela. Não consigo entender como alguém prefere o corredor. É a negação da perspectiva.
Aviões são assim, levam a gente pra cima. Diminuem tudo que está embaixo.
Eu fico besta, com o rosto colado na janela, vendo os aviões indo para a pista da decolagem. Suas asas em riste, faróis ligados. Lindos, enormes. Tão arrogantes. Asas abertas, esticadas. Tenho a impressão de que eles ficam no estacionamento dos aviões encolhidinhos e quando chega a hora de voar, eles se aprumam.
Fico tristíssima quando um deles cai. Não pelas pessoas que estão dentro. É, eu sou assim. Enquanto eu não perder ninguém que eu ame num acidente de avião, ainda sofro mais pelos aviões que não souberam voar.
Eu gosto muito mais de avião do que isso aí que eu falei. Mas acho que dá pra ilustrar.

No blog da mary w: "Tudo isso é nada perto da falta total de sentido que é viver. Eu também sei que o amor não existe e é apenas uma projeção que a gente faz. E eu sei que o ódio não existe, é apenas uma negação daquilo que a gente é."
Não sei linkar pessoas. Esqueci. Mas ela tá logo ali, aqui do lado.

Hoje eu queria passar a tarde num sítio, de vestido de malha surrada, me entretendo em argila, em tecidos e cores, sentada no chão. No sol. Na sombra. No sol. Na sombra. Em silêncio.
Queria fazer isso tomando mate leão feito em casa e perguntando pelo bolo de fubá que estaria assando no fogão.

Hoje eu fiquei sabendo que uma menina aqui da firma disse pra outra menina aqui da firma pra que ela tivesse cuidado comigo porque eu era duas caras.
Ai. Muito forte essa expressão: duas caras.
Mas aí eu sentei de joelho no milho na quina da parede e refleti. E é aquela velha história de que eu seria eliminada do BBB na primeira semana. Realmente. Acho que duas caras é pouco pra mim. São muitas faces de um só ser humano. Muita versatilidade.
A tal secretária tie dye pink, que eu tenho certeza que não é flor que se cheire, acaba de me chamar de "amore". E se ela me chama de "amore" é porque eu dou liberdade e porque consequentemente, eu não sou flor que se cheire. E é daí pra pior.
Estou sofrendo horrores para administrar na minha cabeça o fato de que eu sou uma pessoa double face. E se eu levo isso pra análise, esse assunto me custará muitos dinheiros. Então eu sou assim. Fiquem sabendo.

Não é que eu não goste de teatro. Ta bom, confesso, não gosto. Posso estar errada, possivelmente ESTOU errada, mas a verdade é que teatro me constrange. Tenho uma explicação pra isso. Sou de cidade pequena, da roça, como diz, mais uma vez, nossa velha amiga siri(gaita) ex bbb. Volta Redonda tem ainda menos habitantes do que Uberlândia, vejam só. Duzentos e cinqüenta, trezentos mil habitantes, se muito. Lá na roça não tem muitos teatros e eu passei boa parte da minha vida vendo as pessoas se descabelarem a cada vez que uma semi-celebridade aparecia por lá pra divulgar uma peça de gosto duvidoso. Vi Confissões de Adolescente, Capitães de Areia, toda e qualquer produção que se dignasse a divertir os pobres coitados dos volta-redondenses.

Numa excursão de colégio viemos ao Rio, à cidade grande, passear no municipal, fazer aquelas coisas médias que hoje eu coro só de lembrar. E tinha, em cartaz por aqui, na Casa de Cultura Laura Alvim, uma montagem baseada em Nelson Rodrigues, chamada Melodrama. Era uma peça looonga, em dois atos, com a Drica Moraes. Lembro que os atores usavam lápis vermelho nos olhos, e quando choravam em cena, as lágrimas pareciam de sangue com a tinta escorrendo. Foi um momento único. Realmente adorei. Mas fica a dúvida se foi por causa da peça, especificamente, ou do sangue que jorrava em cena. Adoro sangue jorrando. Adoro melodrama, sou melodramática. Fica a dúvida.

A questão maior de todas é que eu acho que teatro é muito estranho. Me constrange que os atores estejam gritando, esganiçados. Me sinto impelida a jogar umas moedas, sei lá. Tenho vergonha mesmo. Da mesma forma, odeio pseudo-intelectualóides que PRECISAM ver todas as peças em cartaz pra, detrás de seus óculos de aros grossos, julgarem a montagem, a interpretação, o figurino, a direção. Teatro não me interessa. Na mesma série, por motivos muito parecidos, odeio feiras e bienais de livros. Já escutei esses pseudo-intelectuais dizerem que quem gosta de livros não compra na Fnac. Eu compro na Fnac. Vários livros. Aproveito e levo cd’s, dvd’s, dou uma olhada em coisinhas de informática e ipods.

Minha teoria é que a maioria das pessoas que vai a feiras e bienais de livros, ou a peças de teatro, vai pra dizer que foi, e tentar se vender como intelectual. Tem exceções, é claro, muitas, várias. Se esse blog fosse muito visitado, eu provavelmente, em menos de 40 dias, seria malhada como judas. Absurdo, dizer isso. Mas é a mais pura verdade.

Isso não quer dizer que eu não tenha vontade de ver algumas montagens, tipo Ópera do Malandro, ou My Fair Lady, que acabou de estrear em algum lugar que eu não me lembro. Mas não morro por isso. Teatro me constrange. Period.

Que dificuldade que eu tenho. Sempre tive uma sensação horrorosa ao lidar com o cacique aqui da área. E hoje eu consegui o adjetivo que eu tanto procurava. Ele é a pessoa mais esculhambada que eu já tive notícia. Ele é despenteado, os ternos são maltrapilhos, ele funga, ele estala os dedos, ele tem cara de cansado. Ele é uó. Uma esculhambação completa, diria meu pai.

Quando eu entrei na firma, fiquei com o computador que era dele. E vejam vocês, ele deixou um arquivo em word no qual ele tentava entubar um super e maravilhoso projeto tabajara em uma empresa qualquer. Ou seja: ele usava o tempo útil da firma para tocar seus projetos pessoais. É verdade que eu faço isso, todo mundo faz. Só que caciques precisam ser espertinhos o bastante para fazer sem que ninguém perceba, suponho.

E agora há pouco ele falava com o síndico do prédio sobre a reunião do condomínio. Disse que chegaria em 20 minutinhos. Não pode senhor diretor. Não pode. Eu não posso saber que o senhor frequenta reunião de condomínios. Eu não posso imaginar você aprovando cotas extras para melhorias na garagem. Não posso.

E este cacique tem uma secretária que eu vou contar pra vocês. Disus! Hoje, por exemplo, ela estava inteirinha vestida de uma roupa de lycra de tie dye rosa com nuances de pink. Ela tem uns dois metros de cabelo, e estava hoje, quase aos berros, discutindo com a Suelen, coordenadora da escola de Cauã, seu filho, alegando que ele precisa ir para um nível mais avançado no inglês. Realmente. Não sei como esse povo não tem vergonha de fazer isso no trabalho. Por Deus.

Ah, e tem também um cara que eu respeito, um dos poucos, chefe de tribo financeira, que passa o dia a orçar azulejos para a piscina que ele está construindo. Parece que reformou a casa inteira. Agora só falta o fogão.

As pessoas estão muito mais preocupadas com outras coisas do que com o trabalho efetivamente. E isso começa no topo da cadeia. Aí, quando eu sento numa mesa de reunião com essa cambada, eu simplesmente não consigo. Não consigo.


Vamos resumir é o que eu escuto. Vamos resumir então. Reunião de condomínio, afinal.

Se ela dança, eu danço.

Se ela dança, eu danço. Ana Luiza começa o assunto sobre simplicidade voluntária e me pergunta, no eme esse ene, se eu vi a matéria no fantástico. Vi, claro que vi. Fiquei com um pouco de pena daquelas pessoas aparentemente muito calmas e felizes, dizendo que estão aprendendo a viver com menos. Menos expectativas, menos agitação, menos dinheiro, menos sapatos. Menos sonhos, uma delas disse. E foi exatamente nessa parte do discurso que eu parei de olhar para a matéria com alguma curiosidade e comecei a prestar atenção com uma certa pena. Pena de gente que decide parar de sonhar. Se eu paro, é simples a equação, eu morro. Menos sapatos e bolsas me fariam sofrer horrores. Menos agitação seria bom, mas eu teria medo de emburrecer. Porque eu acho que a agitação é que treina o cérebro, de verdade. Faz com que o raciocínio seja rápido, que a gente reaja aos estímulos de forma mais adequada. Porque, fato, os estímulos são muitos.

Eu jamais poderia ser budista, por exemplo. Jamais. Eu sempre faço listas imaginárias de quais as coisas que eu deveria pegar e levar comigo em caso de incêndio no prédio. E ia dar muita coisa mesmo. Meu computador, por exemplo. Adoro. Meus cds, dvds, alguns livros. Meu casaco desconstruído de moleton, que é lindo, lindo, e que custou muitos dinheiros. Minha bolsa de cabrinhas e o vestido amarelo que me custou mais dinheiros ainda. Várias coisas. Uma vez, na faculdade, tentando achar a carteira para pagar o cookie que eu tinha comprado, achei o meu controle remoto da directv dentro da bolsa. Não sabia como ele tinha ido parar lá, na bolsa, em plena faculdade, mas fiquei um pouco feliz por ele estar ali, naquele momento, comigo. E eu sei que isso não faz o menor sentido.

Eu não consigo me desfazer de várias coisas, ela tem razão. Guardo roupas que eu amo e que ainda me vejo usando. Pra mim, às vezes, menos não é mais. Menos é menos mesmo. Ana Luiza está com meu livro "About a Boy" há quase um ano. É um dos meus livros mais queridos, que eu já teria relido se estivesse comigo. E que emprestei de coração (porque eu tenho defeitos, mas tenho coração bão), para que ela lesse e achasse a história foda e fofa, como eu achei. E que, eu sei, ela leu uma ou duas páginas e abandonou, na promessa de voltar. E ela não voltou. E ela não me devolveu. E o livro se mantém refém de uma pessoa desnaturada, que não liga a mínima para o buraco que se instalou no meu coração desde que eu deduzi que ela não estava lendo meu querido livro e que tampouco pretendia me devolver.

Então, esse negócio de viver a vida mais simples pode ser muito bonito, e tal, mas não me serve. Não sei viver com menos. Não consigo podar as minhas expectativas, não troco meu carro por ônibus, não consigo. Não quero pouco, quero muito, sempre. Muito das minhas coisas, muito dos meus amigos, muito do trabalho, das pessoas, de tudo. Tudo meu. Se eu tiver que podar meus sonhos, então, não gosto nem de pensar. Porque, nesse caso, eu, sem sapatos e bolsas, sem agitação, sem preocupações, sem expectativas ou sonhos, ia sentar e morrer. A equação é simples.

Simplicidade voluntária, reportagem do fantástico de ontem. Pessoas que trocam belos apartamentos por apartamentos pequenos. Pessoas que trocam carros por ônibus. Pessoas que optam por menos quantidade e mais qualidade. “Menos expectativa, menos perfeccionismo, menos sapatos, menos roupas, menos consumismo, menos desperdício, menos desejos”.

Repararam? "Menos sapatos"?. Aí não. Menos sapato não dá. Sapatos de menos complicam a vida meu amigo.
Imagina a complicação que seria só ter três sapatos: um preto, um marrom e um tênis. Disus. Não dá não. Não dá mesmo.

“Eu dou conta do que eu tenho. As plantas, por exemplo, como eu não tenho muitas, eu posso ter uma relação muito mais pessoal, intensa, duradoura com cada uma”. “Os livros, se eu não tenho muitos, a minha relação com eles é constante. Eu os revisito muitas vezes.”

Que exagero, hein pessoal do voluntariado? Porque tudo bem que vocês achem um exagero ter mais que três pares de sapato, agora, restringir a quantidade de plantinhas, já é demais. Você não precisa comprar plantas. As pessoas não vão sentir inveja das suas plantas. Tenha quantas plantas quiser. Faz bem. Colabora contra o aquecimento global.

E a regra básica para que você seja um voluntarioso, é que você abra mão das coisas sem sofrer. Eu teria que jogar meus sapatinhos todos fora, achando tudo uma maravilha. Não sirvo. Mas a garota, nossa senhora, ela jamais conseguiria. Ela tem blusas que ela comprou em 1982 no armário. Se a gente pega alguma coisa emprestada, ela sofre genuinamente. A garota, a louca.

O único exercício de desapego que tenho praticado no momento é o desapego ao BBB. Nunca um exemplar da espécie caiu tanto em qualidade no decorrer do programa. Uma tristeza que parte meu coração. Faninha é uma decepção. Noviguaçu transborda em lágrimas.

Ontem eu e a garota estávamos discutindo sobre meus posts enganação. Ela estava me censurando, dizendo que frase não é post.
Concordo que frase não é post, mas eu estudei redação publicitária. Sou sucinta.
E hoje, não mais redatora, entregue ao sistema, não tenho tido muito tempo pra fazer minhas anotações neste caderno verde.
Na mesma conversa com a garota, disse que não queria um diário. Que já tive todas as agendas da Cantão, desde a que tinha um "step by step" na capa, com todos os mine clips coloridos que eu costumava comprar na papelaria Eldorado e que anexavam desde embalagens de chicletes juice fruits até as fotos das minhas miguxas e os colírios da Capricho.
Hoje, choro de rir lendo todas elas. Mas não quero chorar de rir com nada que eu tenha feito aos vinte e cinco anos.
Então a garota disse que Mary W e que Klein fazem suas agendinhas. E se os dois fazem agendinhas, eu posso fazer também.

Ok.

Mas eu não acredito em instituições sem fins lucrativos. Assim como um cara que fez uma peça de teatro onde ele lia as agendas das pessoas que estavam na platéia. E todo mundo ria muito. Achei esse cara um gênio. A garota detesta teatro.
Bom. A verdade é que eu ando muito ruim de post. Não vejo muita lucratividade nisso aqui. E, justamente por esse meu comportamento.inc, ando muito pior, assim, a nível de ser humano. Sou uma chefa sem paciência. Que sugere novas roupas para seus estagiários. E que pede que seus estagiários lhe tragam café com leite. Isso é o fim da picada. Eu sei.
Mas então garota, dê o seu parecer a respeito do teatro, o meio.

Voltei do Rio chorando no avião. Porque sou burra, só por isso. Fosse eu inteligente, não choraria. Mas aí cheguei. E logo no início da semana me mandaram para um evento cretino sobre tendências do segmento de mídia e blá blá blá. Era uma gringa. De terninho azul bebê. Falando sobre tendências. De terninho azul bebê. Azul bebê.
A sala onde o evento ganhou corpo era cinza, com cadeiras de mesa de jantar, num tom de cinza azulado, postas uma ao lado da outra. Aquelas cadeiras não faziam sentido. Nada fazia. Só o café com leite fazia algum sentido. Pouco.
Eu pensava: Disus, where are you babe? Esqueceu de mim aqui, vacilão? E pensava também que aquilo teria fim. E por mais que eu quisesse muito partir, estava sendo obrigada a ficar pelos meus bons modos. Muito feio isso de deixar as pessoas falando sozinhas, ainda que pra outras pessoas.
Mas chegamos num limite y. Meus bons modos falaram com o meu senso crítico e disseram que eu podia ir embora. E eu fui.
Aí, eis que mais tarde fui pra minha psiquiatra. Disse que precisava diminuir a carga horária de avaliação cerebral semanal. E nesse momento, amigos, entendi exatamente o que vem a ser Freud. Freud é muito babaca. Onde ele quer chegar com essa porra toda?
Fora isso, a vida vai bem. Ando um pouco emburrecida por conta do excesso de trabalho. Tento escrever sobre a água com gás. Culpo o verde do template. Mas o Fabrício, amigo da garota, tem razão.
Muito esculacho nessa vida.

"Você está virando uma pessoa fofinha." Essa foi a última que eu ouvi, depois de, num súbito desabafo daqueles bem desesperançosos no meio de uma quarta-feira à tarde, no meio de um trabalho chato e que parece não ter fim.

Eu tento explicar para as pessoas que quando eu tenho uma tarefa que não me estimula, é muito sofrimento mesmo, porque a minha atenção se dispersa e eu passo coisas desimportantes na frente. Eu resmungo, eu levanto, busco água, ligo a música no headphone, vou até a máquina mágica de doces do sétimo andar. Sento na cadeira e quase morro.

E ninguém entende que para uma dda diagnosticada é mais difícil ainda se concentrar em algo que é propriamente impossível de gerar concentração. E eu quase morro. E resmungo, e tento achar metáforas que expliquem para os outros seres viventes, conformadamente fazendo a sua parte, que aquilo ali quase me desespera. Que eu quero gritar, mas que as forças se esvaem. E que a vida escorre de mim, e que eu não posso fazer nada a respeito. Sou uma plantinha sem água, eu digo. E suspiro. E digo que estou murchando, que estou secando e que estou morrendo. Porque eu estou.

E as pessoas dizem que eu pareço feliz, principalmente em uma quarta feira, mas que estou com cara de ursinho carinhoso, com os olhos semicerrados, em câmera meio lenta. E dizem que quando eu uso as metáforas para explicar meu desespero, que eu estou ficando fofinha. Porque eu digo coisas fofinhas, porque isso é muito desestimulante demais. Mas isso só quer dizer que esta batalha está sendo vencida pelos arquivos que vêm da frança, e que se acumulam. E que eu preciso olhar, e adaptar os textos, e corrigir os absurdos. E que me fazem querer morrer. E então, quase morta, eu fico fofinha.

O sábado de sol corria normalmente, com Constança confortavelmente posta à sombra em ambiente refrigerado. Toca o telefone. Ana Luiza diz: "casa da Flávia, casa da Flávia, casa da Flávia". Desliga. Fazer o que? Obedeço. Casa da Flávia.

A casa da Flávia é o ponto de encontro do momento. Lá estão todas as pessoas. Todas as pessoas se conhecem. Por causa da Flávia. Por favor, antes que eu descambe para a minha teoria de que a Flávia liga qualquer pessoa do universo a qualquer pessoa do universo em até 6 graus de separação, lembrem-me das reais razões para esse post. Ah, sim, Maria Clara.

Maria Clara é uma adorável garotinha de 5 anos de idade. Uma criança comum à primeira vista, que chegou acompanhada da irmã mais velha e do primo (nosso amigo em dia de "eu sou legal"), para um refrescante banho de piscina na casa de Flávia, naquele sábado ensolarado. Biquini, rabo de cavalo, uma mini canga, tamanho mini mesmo, de criança. Fófi.

O que primeiro me chamou atenção, lá onde eu me escondia, na sombra com meu copo de coca-cola gelada, é que Maria Clara tinha uma cor linda de cabelo. Meio dourada, de sol mesmo. Cachinhos, uma graça. Se jogou na piscina, fez borbulhas, bateu os pezinhos.

Crianças, para mim, fazem parte de um mundo muito peculiar, que não é o meu. Minha tese é que, como estamos impossibilitados de manter uma conversa minimamente coerente, o adulto que se dispuser a estabelecer contato - verbal, visual, o que seja - terá que lançar mão de suas qualidades de entertainer. Fazer piadas, dançar, cantar, distraí-las. Vale até aquela vozinha infantilizada que muito se vê por aí.

Acontece, senhores, que eu não sou uma entertainer, pelo menos não para crianças. Não sei contar piadas, não tenho as manhas da prática de amizade com seres tão pequenos. E vozinha infantilizada é algo fora de cogitação na minha vida. Logo, me afastei, e quando uma das duas adoráveis garotinhas olhava pra mim, assim, por acaso, me dispunha a dar um sorriso e sair de foco.

E algo inesperado aconteceu. Maria Clara resolveu conversar comigo, e eu, sem graça, acabei respondendo uma ou duas palavras. Perguntei o que ela queria ser quando crescesse e ela disparou: rainha de bateria. Uma criança de 5 anos, de mini canga, querendo ser rainha de bateria. Ela sabia de cór os sambas-enredo da unidos da Tijuca e da beija Flor, e quando eu pedi, inocentemente, que sambasse, não se fez de rogada: Bateu os pezinhos no chão, olhos brilhando, rebolando e girando. E devolveu: agora samba você.

Eu não sambo. Exceto em situações bizarras como a ida á Lapa, onde me dei por vencida. Maria Clara queria que eu sambasse, e nada fazia com que ela mudasse de idéia. Tentei distraí-la, falei que não sabia. Ela disse que me ensinava. Ofereci chiclete. De hortelã, cliclete de gente grande. Ela achou meu trident bem ardido, mas mastigou com força, olhou pra mim e disse: samba! E todo mundo concordou com ela, e é óbvio que eu não ia sambar. E ela não parava.

Maria Clara tem luzes no cabelo. Aquela cor dourada linda, que eu, inocente, achei que era efeito do sol, era química de salão. Ela riu alto e falou que tinha feito "mechas". E sambou, e disse que ia ser rainha da bateria. E comeu o meu trident de hortelã ardido sem reclamar. Maria Clara é a juventude emergente da Barra da Tijuca. Me convenceu a sambar, eu dei um ou dois pulos e ela gritou, maravilhada. Me adorou profundamente. É a primeira criança que vai com a minha cara. Na vida inteira, talvez. E isso é realmente importante, e eu quase acredito que sou alguém mais ou menos legal. No final do dia, já indo embora, tentou me jogar na piscina. Rá. Não deixei. Sabe como é. Tem que ter cuidado com essas crianças de hoje.

Acabo de eliminar todas as dúvidas que eu tinha com relação a seriedade dos horóscopos.
Na Folha de hoje: "Sol conjunto a Urano representa vislumbres novos aos quais se apegar (?), novos sentidos surgindo do presente (?), que antes não estavam delineados. Você brilha fácil. Continue, porém, tomando cuidado com nervosismo e agitações desnecessárias. Cuide de malestares e procure relaxar."
Eu brilho fácil. Acertou. Obrigada.
Ah. Ilma. Obrigada pelos parabéns chuchu. Se eu tivesse seu telefone te chamaria pra festividade. Eu gosto que você saiba que Nextel é coisa de jacarépaguense. Isso vale uma fatia de bolo.

Era uma vez uma garrafa d´água. Essa garrada d´água foi preenchida na fábrica com água e foi gaseificada artificialmente. Eu bebi toda a água que tinha ali dentro. E fico reenchendo a garrafa com água do filtro.
Deve ser muito difícil para uma garrafa de água com gás, viver na companhia de água sem gás. Tá. Era uma tentativa mongolóide de enrolar a freguesia. Não deu.
Vou aproveitar a ocasião do meu desaniversário para agradecer aos inventores de determinados produtos, que fazem do mundo um lugar melhor. Uma coisa assim "oscar". Imaginem-me dentro de um vestido de gala, com um bolinho na mão, no palco, fazendo meu discurso de agradecimento.
Queria agradecer a pessoa que inventou o ar condicionado, você realmente fez da minha vida uma coisa mais estável, tanto para o frio, quanto para o quente. É sempre bom ter opção quanto à temperatura. Queria agradecer, a você que percebeu que envasar água com gás seria um négocio lucrativo e que faria pessoas felizes. A você Ronald, que produz sanduíches maravilhosos, batatas crocantes e vende tudo isso em forma de alegria numerada. A você que inventou a Coca-cola, meus agradecimentos mais sinceros. O meu agradecimento mais especial vai para a pessoa que percebeu que colorir o rosto com cores diversas, pode mudar o seu dia, especialmente quando as cores vêm em embalagens lindíssimas e custam caríssimo. Ao inventor da vassoura elétrica, meu muito obrigada. Inventor na máquina de lavar roupas, não poderia me esquecer de você. Meu jovem Dummont, sei que você se esforçou bastante no quesito 14 bis, mas na minha concepção, o avião só foi de fato inventado quando conseguiram colocar mais de um motor. E você, pessoa inteligente, que conseguiu isso, facilitando o nosso direito de ir e vir, meu muito obrigada.
Poderia continuar aqui, agradecendo a todos vocês, poderia entrar no quesito pessoas, narrar aqui a importância singular de cada um de vocês na minha vida, mas vocês sabem, nesse tipo de cerimônia o tempo é contado.

Pouca gente sabe, mas hoje é desaniversário da garota. Há 25 carnavais, num primeiro de março, em um ano que não era bissexto, nascia aquela lá. Brilho seria se Ana Luiza nascesse num ano bissexto, porque ela teria como data de nascimento o dia 29 de fevereiro. E só faria aniversários de 4 em 4 anos. Ia ser muito brilho. Mas deve ser aquela velha história de jisus looks at her. Ele já devia olhar antes mesmo de ela nascer. Pensou bem em tudo, para que ela não viesse ao mundo em um ano bissexto, em um dia 29 de fevereiro. E para que pudesse ter um dia para chamar de seu todos os anos.

Ana Luiza fala sozinha, ri sozinha e tem palavras que só ela usa. Pergunta de tempos em tempos como é que se escreve obsessão, ou exceção, ou portfólio. Eu respondo. Na maioria das vezes, ela já pergunta escrevendo certo. Ana escreve bem, de um jeito mais rápido, mais curto e mais certeiro do que eu. Escreve doído, sabe elogiar e ofender. Dificilmente eu vi um texto dela que eu faria diferente, que eu trocaria uma vírgula que fosse. Isso toma de mim um pouco da isenção, mas concordo com absolutamente tudo o que ela diz, escreve ou pensa. Se, por acaso, eu não concordar, vou, provavelmente, me perguntar se sou eu que não estou errada.

Ana Luiza tem mania de maquiagem, e me ensinou a pintar o rosto. Passa blush na cara de qualquer um que considere pálido. Um dia, lá atrás, foi a minha vez. Hoje, blush, não vivo sem. Ana me ensinou a passar rímel preto há cerca de 10 dias. Que vergonha, eu achava que sabia. Estou de rímel hoje, e estava ontem, e isso é obra dela. Ana, ao telefone, não começa dizendo alô, nem termina dizendo tchau. Vai direto ao assunto, sempre. Desliga na cara se você estiver desprevenido. É porque o assunto acabou, nada pessoal. Ela odeia falar no telefone. Odeia mesmo. Ligou pra falar que a Analy vetar o anjo foi puro brilho. E desligou.

Ana me mata de vergonha. Faz amizade com qualquer naipe de ser humano que cruze o nosso caminho. Pratica amizade com mendigos, pivetes, vendedores de balas e frutas. Uma vez, quase implorou a um vendedor de caquis que DESSE um pra ela. Gemeu, disse que tinha fome. O cara não caiu. Ela riu. Eu corei.

Ana bebe coca light e prefere cheesecake a brownie no outback. Usa meia-calça colorida para trabalhar em pleno verão, e se irrita quando as pessoas comentam. Usa xales, mantas e sapato boneca. É a melhor amiga pra comprar bolsas, casacos e tomar chocolate quente. Tem um apartamento colorido, que eu só conheço por foto. Tem um carro igual ao meu, que tem cheiro de naftalina. Ana dá nomes aos bichos, aos chaveiros. Me manda calar a boca sem a menor cerimônia, quando eu a interrompo sem perceber. Se qualquer outra pessoa fizer isso, eu me enfureço.

Ana não sabe o nome de nenhum filme, de nenhum ator e nenhuma atriz. Não gosta de filme triste, reclama de filme político. Gosta de Legalmente Loura e de comédias inteligentes. Odiou alguns filmes que eu amo, ri quando eu tento usar as minhas referências de cinema para explicar alguma coisa. Adora Seinfeld, está aprendendo a gostar de Friends. Quase me matou quando eu disse que o Chandler ficava com a Mônica, disse que eu estava adiantando a história. Mas, vem cá... Quem não sabe que Chandler e Mônica são um casal? Ela não sabe.

Ana faz aniversário hoje, e por incrível que pareça, é só o terceiro desde que somos amigas. Parece o trigésimo.

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