Espaço no cérebro. Tudo o que eu quero fazer hoje em dia, paro antes e penso. Vai ter espaço? Espaço no cérebro, me refiro. Porque eu ando tão incrivelmente cheia de coisas na minha cabeça que as associações todas me trazem de volta para janeiro desse ano, quando o meu computador surtou e precisou ser literalmente apagado.

Não é que ele tenha precisado ser apagado porque ele surtou, mas ele já vinha tendo atitudes estranhas há tempos. Eu tentava descompactar o disco e ele se confundia, e ficaria preso pra sempre naquela tela de quadradinhos coloridos, sem nunca terminar a tarefa. Talvez ele seja como a dona, DDA, e ache essa história de descompactar meio chata, e prefira se distrair com coisas menos relevantes e mais divertidas. Porque eu funciono de forma relativamente simples. Se não for divertido, se eu achar que ver sessão da tarde da globo pode ser mais legal, não vai haver nada nesse mundo que me demova da idéia de não produzir. E eu não produzo.

Também não é tão sério assim, apesar de já ter me metido em várias situações bizarras. Eu já fui expulsa de uma aula de balé aos seis anos de idade, a gritos, por um professor espanhol louco, porque enquanto ele tentava explicar como deveria ser o exercício, eu gritava para as outras meninas que todas deveríamos ir para a janela e olhar a “princesa”, cachorra do vizinho. Se isso não for DDA, não sei o que é. Me rendeu uma humilhação terrível, expulsa de sala, da aula de balé. E eu tinha seis anos. Meu computador também não me obedece, e eu vinha atolando-o de assuntos, fotos, downloads, músicas, cookies, e ele não resistiu. Começou a mandar mensagens desconexas e eu achei que bastava instalar um Windows original que ele ficaria bem. E não ficou, e ele precisou ser formatado, e eu perdi todo o meu histórico de e-mails dos últimos 7 anos, e todos os gigas de séries recém baixadas e aguardando atenção.

E então isso me custou muitos dinheiros mesmo, trocamos placa mãe, processador, placa de som, reinstalamos tudo e ele veio assim pra mim, sem memória dos acontecimentos passados, como um bebê, pronto pra ser treinado e programado novamente. Eu exercito o desapego às coisas que se perderam todos os dias. Pra garantir, mandei o nerd da loja de computadores juntar mais 80 giga de memória aos 80 pré-existentes, pra que os novos 160 gigas de espaço me rendessem momentos de pura alegria atolando-o novamente com os arquivos todos. E isso é basicamente o que eu venho fazendo com a minha cabeça, só que sem formatar, sem descompactar, sem limpar a lixeira e sem reinstalar absolutamente nada, nos últimos 27 anos.

E ontem eu vi que o pobre do computador tem pouco mais que 5 gigas livres, e que nova faxina se faz necessária. E meu cérebro vem surtando nas últimas semanas. Eu misturo a matemática aplicada do MBA com episódios de Heroes, palavras e francês e termos técnicos de um monte de coisas. E não tem sobrado muito espaço não. Não tem espaço no cérebro pra, por exemplo, perguntar sobre nada da vida de ninguém. Eu penso assim: eu quero MESMO obter essa informação? O que eu faço com a informação depois que eu tiver ouvido a resposta? Guardo no cérebro? Porque o cérebro anda sobrecarregado, e eu acho que eventualmente ele vai mandar mensagens desconexas. E não vai ter reinstalação que dê jeito. Novas bandas, novos discos, novas séries, novos idiomas. Aniversários, telefones, eventualmente o meu próprio nome será esquecido e eu dependerei da boa vontade de estranhos.

Ontem eu descobri o sugarfight. Klein me recomendou, mary w linkou, tive que ler. E a autora não abre pra comentários. Acho tão bom isso de não abrir pra comentários. É de uma grandeza espiritual. É tão contrário ao narcisismo. Coisa de gente fina mesmo. Quando eu crescer, quero ser assim.

Ontem eu estava falando de Paris. Aí, hoje, eu, boba, fui ao Fickr dar uma olhadela das fotos que as pessoas andam fazendo mundo afora, da minha queridona.

E um desespero fenomenal se instalou no meu eu. Enquanto estou aqui, sendo amaldiçoada pelo ser humano que senta do meu lado, que tinha se levantado da mesa ao longo da frase, e que voltou até o computador para bloqueá-lo para que eu não faça nenhuma travessura nos arquivos dela, ou para que eu não veja o quão mal ela fala de mim com pessoas no msn, nesse mesmo exato momento, existem pessoas passeando pela avenida Champs-Élysées.

As pessoas podem estar andando por lá para irem ao trabalho, podem ser turistas passeando, pode ser uma menina que acaba de brigar com o namorado e que está sofrendo enormemente. Mas essas pessoas estão na Champs-Élysées. Elas estão vendo o arco do triunfo logo ali na frente, ou ele está lá, imponente que só, nas suas costas.

E eu? Cadê eu? Quem sou eu?*

Eu sou uma boba. Sozinha em SP ou sozinha em Paris, sozinha igual. Mas o cenário para as minhas cenas de depressão ficariam muito mais ricas às margens no rio Sena.

* minha analista teve a coragem, a pachorra, de me mandar essa pergunta. Por pouco eu não levantei e fui embora.

A firma nova fica na Rua Amauri. Pra quem não sabe a Rua Amauri é cheia de restaurantes caríssimos, um ao lado do outro. Freqüentado por pessoas que falam inglês em telefones celulares daqueles que dispensam o uso das mãos. Freqüentado por gente fina e por jogadores de futebol. Ou seja, toda sorte de gente que dispõe de dinheiro em grandes quantidades.

Naturalmente, essas pessoas se locomovem em carros que, até ter vindo trabalhar na firma, não tinha conhecimento da existência. É agressiva a quantidade de mercedes e porches e desse tipo de carro surreal de caro. Desses carros com bancos de couro cor de creme. E vocês sabem, banco de couro creme deve ser o supra-sumo dos bancos de couro. Audi aqui é Gol.

Aí, os bacanas entregam seus carros sinistros pros mocinhos do vallet parking. Aí os mocinhos do vallet, normalmente mão de obra importada do nordeste, pegam os carros e viram a esquina, levando os carros para o estacionamento.

No caminho, eles param, encostam, botam o braço pra fora do carro, conversam, proseiam, tudo isso a bordo de carros que mais parecem naves espaciais.

E eu adoro isso. Adoro.

E a casa ficou vazia de novo. E o que estava atormentado, e o que ficou maior com menos espaço, volta a ser pequeno e vazio. Todo movimento de ida e de vinda tem me ferido de morte. Eu fui ferida de morte ano passado. Não morri inteira, mas morri metade.

Esse afastamento me custa muito. E fico pensando o que me motiva. Talvez eu precise da distância. Talvez eu precise ir morrendo aos poucos. Talvez eu precise ensurdecer no meu silêncio.

E nem um cachorro malcriado eu tenho. Minhas paredes de concreto me refletem.

Eu e eu por todos os lados. E só.

Hoje eu estava alongando as pernas depois da ginástica. Eu estava com a mão nos pés e consequentemente com a bunda pra lua. E só o que passava pela minha cabeça eram as seguintes frases: "essa posição dá dinheiro" e "foi assim que Napoleão perdeu a guerra".

To destruída. Minha agenda parece rotina de criança. Às seis horas vai pro colégio, depois do colégio vai pro ballet e depois do ballet vai pro inglês e depois pro karatê e depois pro francês. Não tem nem mais ballet e nem colégio, mas tem psiquiatra no meio de toda a confusão. E tem guerra fria no sirviçu novo.

Ontem eu tentei ver o C.S.I. Eu juro que eu tentei. Mas na hora em que passa o C.S.I o meu cérebro já não funciona mais. Vale a intenção?

Ah, eu escrevinhei um texto sobre o sirviçu novo. Mas a garota disse que pode melhorar. Na verdade até pode melhorar, mas é que eu não vou melhorar. Tá, eu vou melhorar, mas eu preciso de mais tempo.

Semana passada garota me chamou no msn, querendo praticar amizade. Disse que estava vendo "Medium". Tipo pra fazer uma média, já que a viciada em séries sou eu. Acontece que Medium é uma das séries mais chatas do mundo, e eu nem sei como ainda não foi cancelada. Falei pra assistir Ghost Whisperer, na mesma linha, só que mais "assistível", com histórias nem tão ruins assim, e ela pediu que eu fizesse uma listinha de séries legais pra ela assistir.

Madame T tocou em dois pontos fracos de Madame Ç. Adoro fazer listas, adoro séries. Fazer listas de séries, okay, adoro mais ainda. Tenho listas das séries que eu mais amo em todos os tempos, e que já foram canceladas, tipo Party of Five, Jack and Jill e Dawson’s Creek. Tenho séries que eu nem assisto a não ser de vez em quando mas que eu sei que vou amar cada minuto quando tiver a decência de assisti-las. Nunca segui Six Feet Under, não sigo Desperate Housewives, segui apenas duas temporadas de Alias. E são séries que, tão logo minha agenda permita, estarão me aguardando em torrents no computador. Adoro séries narradas em terceira pessoa, adoro séries de humor negro, adoro referências e personagens bem construídos. Uma série me ganha com um personagem que seja escroto, tipo o House, tipo o Brian Kinney de Queer as Folk. Mas, infelizmente, das séries que eu amo, poucas são as que continuam no ar hoje em dia.

Então, Madame T, vou tentar dizer o que você deve assistir, e já adianto os motivos. Na ordem.

Tem que ver House, que é um médico manco, malcriado, cínico e misantropo, que repete exaustivamente, entre outras frases geniais, uma espécie de mantra: "Everybody lies". Ainda na linha hospitais, que virou febre no momento, e que eu adoro mesmo, tem que ver Greys Anatomy, na sony, segunda à noite. Série narrada em terceira pessoa, sempre com um tema como viés para os acontecimentos. Meredith é uma residente em um grande hospital, envolvida com o médico chefe, que é casado com uma médica. É da Meredith uma das melhores frases que eu vi em seriados na temporada passada: "You don't get to call me a whore". Pergunta para as suas novas miguxas, essas aí de São Paulo, se Greys Anatomy não é brilho puro? E, clássica das clássicas, na quinta feira às 22h, ER, na warner. Dá pra combinar ER e House, uma seguida da outra, na quinta feira.

Pra atualizar, o House é aquele que também é pai do Stuart Little. O McDreamy, de Greys Anatomy, fazia todos os filmes da sessão da tarde nos anos 80. Era feio mas, incrivelmente, ficou bem interessante com rugas. O amigo do House, o Dr Wilson, explodiu os miolos em Sociedade dos Poetas Mortos, só porque o pai dele não quis deixar ele ser o Puck em Sonho de Uma Noite de Verão. Tudo gente conhecida, você se sentirá praticamente entre amigos.

É tarde pra te indicar Lost, mesmo porque a série perdeu espaço pra Heroes, que parece ser legal, e é basicamente pessoas com superpoderes espalhadas pelo mundo. Heroes, já adianto, não assisti ainda, mas tá na to do list. Corre que ainda está na primeira temporada, dá tempo de ver sem pegar a história muito pela metade. Das historinhas curtas, com meia horinha de duração, tem que ver Scrubs, sobre - again - uns residentes malucos em um hospital. Teve um episódio na temporada passada que foi todo inspirado em o mágico de Oz, com JD, o residente maluco número 1 de sapatos vermelhos de Dorothy. Bem bom mesmo. Ainda tem The New adventures of the old Christine, com a sua querida Elaine de Seinfeld. What about Brian até promete, mas não entrega. Nem perca seu tempo. Desperate Housewives vale à pena sempre. Também narrada em terceira pessoa. Tem a Lois Lane como Susan, uma das donas de casa deseperadas. E tem a Bree Van De Camp, que era a louca da Kimberly em Melrose Place, que depois de voltar da morte careca, explodiu o condomínio, deixou a Alisson cega e finalmente morreu, nem sei bem de que.

Seja lá o que você estiver pretendendo, não se aproxime de Medium. Pior escolha não há. E, pensando bem, fique longe de Ghost Whisperer também. Melinda não tem carisma, fica falando com fantasmas, e tem o péssimo hábito de ajudar as pessoas. Muito over.

Alterações hormonais fodem a dignidade do ser humano (x) F. Impressionante.

Saudade de tudo que eu não tenho mais.

Eu preciso fazer dois posts. Um sobre a minha saída e um sobre a entrada. Um mais um igual a dois. Vou tentar esse final de semana. Como diria o Silvio: aguardem.

Então, outro dia, ali atrás, Disus olhou para a garota e ela pediu demissão. E hoje, que é o primeiro dia dela no novo mundo, ela desaparece. Não é um desaparece qualquer, do tipo cheguei atrasada no trabalho ou esqueci de ligar o msn, e por isso não estou online, so sorry. É um offline diferente, cheio de significados.

Então, Madame Ç sabe, Madame Ç explica.

Entrar em um novo trabalho é uma caixinha de surpresas. Sempre. Pode ser o melhor lugar do mundo, pode ser um lugar apenas ok, cheio de novidades por causa da mudança e de todas as coisas que ela traz consigo. Quando alguém entra em um lugar novo, antes mesmo de desejar boa sorte, eu desejo a essa pessoa que a semana dela passe rápido, beeeem rápido. Porque ela vai sentir cada segundo dessa semana, and not in a good way, if you know what i mean.

Em alguns, a sensação é potencializada por características como ansiedade, ambiente hostil ou severa inabilidade social (que é o meu caso, eu acho). Não é que eu não seja alguém sociável, veja bem. Eu sou. Mas eu estranho novos ambientes, novas funções, novas pessoas. Lidar com mudanças, se despedir do que quer que fosse e que viesse preenchendo os seus dias até então, fosse a Sonia Abrão na rede tv de tarde, fosse academia e idas ao shopping, fosse uma "firma" aparentemente maravilhosa e cheia de oportunidades, que te fizesse sentir num clube (como sócio VIP), ainda que o novo environment ofereça muito mais.

Daqui a exatos 22 dias eu completo um ano aqui no trabalho. E eu me lembro o terror que foi, um ano atrás, entrar aqui e me acostumar com todas as novas coisas. Eu tive insônia. Tentei culpar o excesso de cafeína, mas é certo que estava ansiosa. Porque os problemas são muitos. Vou enumerá-los, para facilitar a vida de quem se dispõe a ler esse texto, tão longo quanto os outros:

1) Na véspera, vem o primeiro dos seus martírios: outfit. Roupa, traje, vestimenta. Se você for observador, vai ter prestado atenção na forma como os seus futuros co-workers se vestem, pra entender se aquela é uma empresa formal, casual, desencanada ou whatever. Sua roupa da entrevista não serve, e explico o por que. Não é todo mundo, mas tem quem repare, sim senhor. Eu sei a roupa que eu fiz entrevista aqui há um ano atrás, e saberia caso tivesse me entrevistado. Porque tem dias que roupa é importante, sim, mais importante do que o normal, e é sempre divertido analisar a decisão que a pessoa tomou e as escolhas que ela fez para um dia desses. Você sempre estará correndo o risco de estar mais arrumado que os outros. Já vi terno e gravata em empresa ponto com, e disso a garota também deve se lembrar. No meu primeiro dia na empresa ponto com que eu trabalho hoje, deparei-me com um cidadão de bermuda. Madame T não tem esse problema. Ela lança a bolsa dourada, passa sombra e blush e tudo às mil maravilhas.

2) Você chega na hora no seu primeiro dia de trabalho, ainda que não pretenda repetir esse comportamento a partir da segunda ou terceira semana. Pois bem, chega na hora. Você se dirige à secretária, ou à pessoa que deverá encaminhá-lo à sua nova mesa, sua nova seção, whatever. Você diz: Bom dia, meu nome é fulano, eu começo aqui hoje como (digite a função). Só que muito provavelmente, a pessoa que deverá se encarregar de você nas suas primeiras horas de trabalho, e talvez até nas outras, ainda não chegou. Também, o que vc esperava? É segunda feira, caramba, quem é que chega às 9h em ponto para o trabalho, a não ser você, que começa hoje e quer causar uma boa impressão? E você tem que ficar esperando, ainda na recepção, até que fulano chegue para ser sua babá. E você ainda correrá o risco de que ele esteja sem paciência, já que sabe que precisa ser babá de uma pessoa que, até pra beber água, vai precisar de ajuda. Madame T não liga, acha isso uma bobagem. Ela chega, se apresenta, e arruma o que fazer.

3) Será que tem MSN? Será que é liberado? Seus amigos estarão todos absolutamente curiosos para saber os detalhes da nova empreitada. Será que posso checar meus e-mails pessoais do trabalho ou webmail é bloqueado? Será que dá pra ler blogs? Notícias? Mais tensão. Madame T checa isso tudo antes mesmo de entrar na empresa, pra evitar imprevistos.

4) Hora do almoço. Onde será que os seres humanos comem? Será que tem opções saudáveis? Será que vai dar pra manter a dieta? É caro? É barato? Será que ainda hoje eu ganharei os tickets ou terei de pagar o meu almoço e pedir reembolso depois? Quanto tempo é tolerado para o almoço? E se ninguém me convidar pra almoçar? E se me isolarem? E se, tendo que almoçar sozinho, eu esbarro nos co-workers no restaurante da esquina, e eles ficam jogando uns para os outros a tarefa de me convidar para me sentar em sua mesa? Muito high school, muito verdade. Na minha modesta opinião, o maior terror de um primeiro dia de trabalho é o almoço. Você fica esperando te convidarem, sem saber se irão ou não. Ninguém te conhece, você vira uma batata quente na mão de estranhos. Você pode deixar pré-agendado um almoço com algum amigo que trabalhe próximo ao seu novo trabalho, mas correrá o risco de parecer mal-educado se, no caso de um convite para a prática de amizade corporativa com co-workers, recusar tão gentil convite. Se eles chamarem para almoçar, beleza, seja simpático, engraçado, tente não assustar ninguém sendo você mesmo. Lance uma personalidade alegre, pareça legal. Nota: nesse momento, é mais importante parecer legal do que necessariamente sê-lo. Depois é outra história. Madame T não liga. Ela parece legal. Ela é phd nisso. Eu chamo de modo Madame T de funcionamento.

Esse é o momento em que todo mundo julga pelas aparências. Ninguém está preocupado se você é realmente legal, eles precisam te rotular, assim como você mesmo estará fazendo com os outros. É cruel, eu sei, mas caia na real. Se você está acima do peso, não peça sobremesa. Se estiver abaixo, não peça salada. Se fizer escova, faça uma das boas. Daquelas que nem parecem escova. Cabelos domados são importantíssimos quando te julgam pela aparência. Se vc falar demais, é exibido e forçado. Se falar de menos, é tímido e anti-social. Equilíbrio é a palavra-chave.

5) No primeiro dia, você vai ser atualizado. Vai participar de reuniões, vai ter que ler sobre a empresa, ver números, dados, whatever. Pareça interessado, mesmo que ainda não esteja. E você é, sim, o centro das atenções. Não se engane. Se te acharem bonito(a), se te acharem feio(a), desengonçado, elegante. As pessoas irão disfarçar, é claro, mas estarão olhando para você, e falando sobre você. Madame T faz notas mentais pra escrever e-mail detalhando tudo depois. Dela? Dela não falam, imagine!

6) Hora de ir embora. A partir de 18h, você vai começar a ficar tenso, e começar a prestar atenção em como as pessoas se portam. Se elas vão embora mais cedo, se pega mal sair APENAS 40 minutos depois do "final" do expediente. Espere seu chefe dar as coordenadas. E torça para que ele não seja do tipo que mora no trabalho. Se você for o chefe, exerça seu lado mais sádico: demore bastante, porque todos ficarão esperando você sair para irem embora. Madame T gosta de ficar na firrrrma, e é sádica.

Se você conseguir sobreviver à primeira semana, relaxe. Mas continue sendo legal. Ou fingindo ser. Deixe pra ser você mesmo depois de, vejamos, 3 semanas. Quando puder pegar a todos desprevenidos.

Todas as considerações acima não servem se a pessoa em questão for Madame T. Madame T é do tipo que chega dando bom dia a todos, usando uma mega bolsa dourada escandalosa (mesmo!), faz brincadeiras acertadas mesmo que seja com desconhecidos, almoça sozinha sem se sentir abandonada. E some do msn no primeiro dia, pra deixar na minha cabeça todas as preocupações que deveriam estar na cabeça dela.

Era domingo. O Fantástico estava acabando e Alcione circulava tensa pelo encanamento do prédio em busca de uma tv ligada na tv Globo. Há! Aqui!
Avisou aos seus pais que daria uma saída, mas que já já estaria de volta. Os pais da menina só permitiam passeios pelos encanamentos de outros andares. Ela nunca teve permissão de se aventurar pelas casas de humanos. Muitas primas da menina já haviam desaparecido depois de se aventurarem para fora dos encanamentos.
Alcione já ouvira falar que a casa da Madame T. era a mais bonita do prédio. “Casa de menina” era o termo que usavam pelos canos.
Ela se arriscou. Desobediente que só ela, saiu ralo a fora, bateu as asinhas e sacudiu as antenas. Andou bem devagarinho. Para sua surpresa, a casa onde o BBB começava a ser exibido era a tal da casa mais bonita do prédio. Ficou muito satisfeita e se identificou com as cores. Ela queria uma casa igualzinha àquela.
Logo pensou que nunca mais sairia dali. Reparou que estava escuro e correu para garantir um bom ângulo da tv.
Tudo ia bem até que a dona da casa reparou um movimento. Oh céus! Vou morrer! O desespero se instalou na pequena. Uma pessoa enorme veio andando em sua direção. Pânico.
Ficou feliz quando reparou no gigante se afastando. Correu para baixo do banco para ver o BBB em paz. Na sala, ao lado de uma poltrona branca bem bonita.
Estranhou o fato do gigante ter saído de casa justo na hora do paredão Bruna x Carol. Justo na melhor parte do programa, se perguntou. Reparou que um gigante maior ainda varria o quarto no melhor momento do jogo.
Logo depois da eliminação voltou rapidamente para os canos, como havia prometido para os seus pais. Ficou de voltar.
Alcione anda preocupada. Ouviu dizer que a prefeitura dos canos desapropriará todas as casas irregulares instaladas por lá.
Vai saber... Não quis arriscar. Está se mudando com toda a família para o apartamento colorido. Convenceu seus pais de que lá eles estarão a salvo.

Tá bom, tá bom. Fui muito júnior. Muito Júnior. Perdi a barata. Não soube reagir diante de pressão alienígena.

Mas note: como você fez questão de evidenciar, a barata continua aqui em casa. Isso significa que eu já dormi duas noites com a marrom no meu quarto. E isso é, obviamente, um sinal de Disus de que estou apta a fazer qualquer coisa nesta vida. Porque vai me desculpar, mas muito mais profissional do que matar baratas, darling, é conviver com elas.

Estou com uma espécie de síndrome de Estocolmo da barata. Refém e completamente rendida, a vítima se apega ao bandido.

O primeiro passo foi dar um nome: Alcione. O segundo foi ligar pra uma empresa de dedetização especializada e acabar com essa amizade estraga roteiro entre bandidos e mocinhos. O terceiro foi comprar as tampas pros ralos que você sugeriu.

Se ela dança, eu danço. Enquanto a garota via bbb, inocente, a barata se revelou e caminhou para o quarto. E a garota se deu conta de que às vezes, sim, faz falta um ser do gênero masculino pra dar o golpe certeiro, daquele que estoura as tripas e deixa aquela gosma nojenta à mostra. Na verdade, mais do que um "se ela dança eu danço", inauguro aqui uma nova seção: Madame Ç sabe, Madame Ç explica.

Eu fui obrigada a morar sozinha antes dela, e é por isso que tenho as manhas. É difícil lembrar de tudo quando a gente dá conselhos. Quando eu disse pra ela que arroz não ficava legal congelado, ou que não é bom congelar e descongelar carne mais de duas vezes, eu sabia o que eu estava falando. Sabia também o que dizia quando ensinei a fazer uma sopa que durasse a semana toda, ou quando providenciei que ela tivesse em casa um processador legal, daqueles coloridinhos de menina, para que a tarefa de picar as paradas de cozinha fosse menos disgusting. Pastinhas rules, eu disse.

Mas dei mole, não entrei no capítulo baratas e outros insetos. E, no meio do bbb, ela se viu desamparada, e cometeu uma série de erros.

Capítulo I - Dos dois tipos de baratas existentes
Primeiro, vamos começar explicando sobre as baratas. Não contem comigo para falar sobre o nome científico, porque pesquisar esses bichos nojentos no google já é um pouco demais. Tudo o que sei veio de observação cuidadosa. Ou umas olhadas rápidas em meio a gritos. Existem 2 tipos de baratas. Uma é cascuda, marrom claro, grandona e ágil. Pode voar, é capaz de avançar na sua direção se sentir cheiro de medo. Essa barata é capaz de olhar pra trás, experiência que eu mesma pude comprovar há cerca de 4 anos atrás, quando testava uma outra teoria: a de que baratas têm memória curta. Tentei acertar uma dessas criaturas na cozinha, e ela escapou. Pensei, se ela tiver memória curta, já já esquece o golpe anterior e eu posso tentar o próximo, certeiro. Ela estava de costas pra mim, e eu me encontrava em uma "confortável" situação de sensação de controle. E a bicha, ainda de costas, se inclinou, meio que olhando de costas. Viu que eu ainda estava ali e correu mais.
O segundo tipo de barata é marrom bem escura, mole, não tem asas ágeis, é mais lenta e mais gordinha. Em comparação com a voadora, é certamente menos atlética. Essa barata, quando explodida com o golpe, causa estrago maior. É mais fácil de ficar dopada com Raid, já que é tranquilo de ser alcançada. Os dois casos têm prós e contras. Eu, pessoalmente, tenho horror às voadoras, principalmente por causa de sua rapidez. É difícil acompanhá-las, geralmente elas desaparecem no espaço de tempo em que você conseguiu alcançar o chinelo ou a vassoura. O que nos leva ao próximo capítulo.

Capítulo II - dos instrumentos para o ataque
Raid, Baygon, SBG, Rodasol: bons instrumentos para deixarem as baratas "de barato", meio lerdas, em transe, grogues, prontas para a etapa dois do procedimento.
Chinelo: Um clássico, que executa bem o seu papel. Especialmente quando utilizado por um homem, uma vez que é preciso se aproximar bastante do inimigo para abatê-lo. Eu tenho nojo, porque meus sapatos são bonitinhos por demais para serem envolvidos pela gosma de tripas de baratas. Meus chinelos inclusive. Depois tem a clássica questão que deve ser lavar um chinelo desses, retirar os restos mortais. Não dá.
Vassoura: Melhor opção, já que garante a distância entre vítima e algoz. A vassoura tem um contra, já que tira um pouco da mobilidade de quem a opera em tão ilustre tarefa. Mas, mais uma vez, qualquer pessoa que tenha passado por aulas de física no colégio, estará apto a desenvolver uma fórmula muito simples, que otimizará as chances de êxito. Velocidade média = delta S sobre delta T. Basta calcular a velocidade média que a bicha se locomove, e qual o espaço que ela deverá percorrer no espaço de tempo que você leva pra erguer e baixar a vassoura, com toda a força. Com os cálculos bem feitos, é possível fechar os olhos e gritar enquanto é desferido o golpe fatal. Costuma ser tiro e queda, e não é recomendado quando existem mais pessoas na casa, e se for no meio da madrugada. Meu pai uma vez ficou muito puto quando foi acordado com o meu grito durante um golpe desses. E, minha gente, não foi legal.

Capítulo III - Das formas de evitar o confronto, ou mesmo minimizar os efeitos
Chão: Recomendo o liso e lavável. Matar barata no carpete exige coragem, falta de preocupação com higiene ou alguém que se disponha a esfregar o chão no seu lugar.
Tampas nos ralos: Pode-se usar filme plástico, envolvendo a tampa do ralo quando a mesma é removível. Funciona bem, e segundo aqueles caras que lutam contra a dengue, protege também do aedes aegypt. Outra opção é um disco de borracha pesado, pra tampar ralos mesmo, à venda em lojas especializadas.
Borracha na porta do apartamento: existe uma borracha, que parece um rodo, que é fixada no pé da porta de entrada dos apartamentos, e evita que tão monstruosas criaturas adentrem o seu lar pela porta da frente, sem serem convidadas.
Redes na janela: muito úteis no caso das voadoras, mas nunca experimentei.

Adendo:
Erros cometidos pela garota e que, se evitados, poderiam ter minimizado o estrago e a tensão.
Madame T, darling, não vou te enganar. Aquele baratão ainda está na sua casa. Você errou não tendo o spray e errou novamente não tampando os ralos. Mas o seu maior erro, anote aí, foi correr na direção contrária. Um especialista em baratas, quando em confronto com um exemplar - principalmente a cascuda, atlética e ágil, jamais deverá perdê-lo de vista, sob o risco de nunca mais encontrá-lo. Quando você correu para o corredor, desceu as escadas e procurou o porteiro, você estava dizendo para o baratão que ela podia se acomodar. E ela fez isso. A essa hora, está em um cantinho escuro, quente e úmido, se alimentando dos restos de comida da sua casa, botando ovos e povoando o lugar. Numa próxima oportundade, tome nota mais uma vez, olho na barata, olho na vassoura, raid, espirro, ela ficou lerda e você calcula a velocidade para o golpe com a vassoura. E faz um post sobre a sua vitória.


Em tempo: Informação importante, que precisa ser levada a sério. Baratas se fingem de mortas. Um golpe nunca é garantido. Tente mais de um, dois, três, até que ela esteja sem pernas, asa, as tripas expostas. Espirre mais Raid, pra garantir. Pegue e jogue no vaso. Se a bicha ficar no chão ou for jogada no lixo, ela revive. Fato.

Eu tava na sala vendo bbb. Tranqüila. Na minha poltroninha branca. Aí, eu percebi um movimento rumo ao meu quarto. Fui até lá, suspeitando que coisa boa não deveria ser. Acendi a luz, olhei pro lado e o pânico se instalou. Era uma barata. Grande. Uma barata. No meu quarto.

Eu sabia que isso aconteceria. Um dia eu estaria em casa sozinha e a dita cuja apareceria pra evidenciar a minha nova condição de pessoa sozinha e desamparada. Eu sabia.

Respirei, buscando um pouco de razão, diante da barata. Pensei, raciocinei. Pensei que se eu não tivesse visto a bonitona passar, eu teria ido dormir em paz. A ignorância liberta.

Liguei pro porteiro pra perguntar se ele tinha algum daqueles produtos que não matam baratas mas que as tornam cada vez mais resistentes, com a promessa de matar baratas. Ele não tinha. Desci pra portaria, não estava confortável na presença da moça. Agora eu entendo muito a importância de dois quartos ainda que para uma só pessoa.

Pedi pro porteiro subir e matar a bonitona. Enquanto ele estava na minha casa, pensava que seria bacana da parte dele, ainda que ele não achasse a marrom, que ele me dissesse que tinha lutado, mas que ela havia perdido a batalha.

Mas não. Zé João desceu e me disse que ela sumiu. Não me restou nada a não ser subir e enfrentar. Não achei. E agora eu to aqui, como Gregor Samsa, em cima da cama, pronta pra virar uma barata. A qualquer momento isso pode acontecer.

E se eu conseguir dormir declararei minha total e completa independência de homens nesta vida.

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